109. Tudo, Tudo


Tudo, tudo Deus me mostra
Para mim reconhecer
Tudo, tudo é verdade
E eu não posso me esquecer

A minha Mãe que me ensina
Que me entrega este poder
Tomo conta e dou conta
E eu não posso me esquecer

Sigo a minha viagem
Dentro desta primozia
Tudo, tudo é verdade
No reino da soberania.

 

No estado de superconsciência proporcionado pela ingestão dessa bebida de “poder inacreditável” (Daime), “tudo, tudo” Deus nos mostra, ao abrir o nosso olho único ou espiritual, no ponto entre as sobrancelhas. “Se, portanto, o teu olho for único, todo o teu corpo será luminoso”.[415]

Esse olho onisciente é mencionado de vários modos nas escrituras sagradas: terceiro olho, Estrela do Oriente, olho interno, a pomba descendo do céu, o olho de Shiva, o olho da intuição.[416]

O primeiro homem divino criado por Deus (Adão) tinha sua consciência centralizada no olho único onipotente, na testa (a leste). Os poderes onicriadores da vontade, focalizados nesse ponto, perderam-se quando o homem começou a “cultivar o solo”[417] de sua natureza física.

Deus, ou a Consciência Divina presente no primeiro casal criado, aconselhou-os a usufruir todas as formas de sensibilidade, com uma exceção: as sensações sexuais. Estas foram proibidas, a fim de que a humanidade não se enredasse no método animal, inferior, de procriação. A advertência para que não reavivassem lembranças bestiais arquivadas no subconsciente não foi atendida. Regredindo a forma grosseira de procriação, Adão e Eva caíram do estado de alegria celestial que era natural ao homem perfeito original. Ao “perceberem que estavam nus”, perderam sua consciência de imortalidade, conforme a advertência de Deus; colocaram-se sob as leis físicas, segundo as quais ao nascimento do corpo deve seguir-se a morte do corpo.[418] 

O livro de Gênesis é simbólico-parabólico e não deve ser interpretado literalmente. O corpo humano é a “árvore da vida”; a coluna vertebral assemelha-se a uma árvore invertida, tendo como raízes os cabelos do homem, e como galhos, os nervos aferentes e eferentes. A árvore do sistema nervoso dá muitos frutos apetitosos: as sensações da visão, da audição, do olfato, do paladar e do tato. Estes, o homem tem permissão de desfrutar; mas lhe foi proibida a experiência do sexo, a “maçã” no centro do corpo.[419]

A serpente representa a energia enrolada na base da espinha, que estimula os nervos sexuais. Adão é a razão, Eva é o sentimento. Quando o impulso sexual suplanta a emoção ou consciência-de-Eva em qualquer ser humano, sua razão ou Adão também sucumbe.[420]

O conhecimento do “bem e do mal” prometido a Eva pela “serpente” refere-se às experiências dualistas e opostas pelas quais todos os mortais, sob o domínio da ilusão, devem passar. Caindo na ilusão, pelo uso incorreto de sua razão e de seu sentimento, ou consciência-de-Adão-e-Eva, o homem renuncia a seu direito de entrar no jardim dourado do Pai Verdadeiro. Após a “queda”, a responsabilidade pessoal de cada individuo passa a ser retornar com os seus pais (Adão e Eva, isto é, natureza dual) à harmonia unificada – o jardim do Éden.[421]

Essa é a salvação prometida por nosso Senhor Jesus Cristo, o retorno à casa do Pai, pois “a quantos o receberam, deu-lhes o poder de se tornarem Filhos de Deus”[422]

Tudo, tudo Deus me mostra
Para mim reconhecer
Tudo, tudo é verdade
E eu não posso me esquecer

O apóstolo Paulo, um ser humano plenamente realizado, “não mais vivo, e sim Cristo vive em mim”,[423] atingia a consciência crística na miração: “não miramos as coisas que se vêem, mas sim as que não se vêem. Pois as coisas que se vêem são temporais e as que não se vêem são eternas”,[424] e isso lhe proporcionava uma “glória incomensurável”.[425]

A minha Mãe que me ensina
Que me entrega este poder
Tomo conta e dou conta
E eu não posso me esquecer

Cônscio da responsabilidade lhe outorgada pela Rainha da Floresta de levar adiante a sua missão espiritual, Mestre Raimundo Irineu Serra faz um juramento: “tomo conta e dou conta”, e desse encargo não pode olvidar-se.

Modelo ético e moral para todos os soldados da Rainha, esse compromisso é lembrado todo dia 15 e 30 na leitura do Decreto de Serviço, quando do ritual de concentração: “a verdade é, que o centro é livre, mas quem toma conta deve dar conta; ninguém vive sem obrigação e quem tem obrigação tem sempre um dever a cumprir”.[426]

E esse compromisso é selado nos versos finais de tão esclarecedor hino:

Sigo a minha viagem
Dentro desta primozia
Tudo, tudo é verdade
No reino da Soberania.


Notas:

[415] Mateus 6: 22; o olho único ou espiritual pode se tornar visível na parte central da testa.
[416] YOGANANDA, Paramahansa. Autobiografia de um yogue. Rio de Janeiro: Lótus do Saber, 2001, passim.
[417] “Por isso o Senhor Deus o expulsou do jardim do Éden, para cultivar o solo do qual saíra”; Gênesis 3: 23..
[418] YOGANANDA, Paramahansa. Autobiografia de um yogue. Rio de Janeiro: Lótus do Saber, 2001, p. 188.
[419] Idem, p. 186-187.
[420] Idem, p. 187.
[421] Idem, p. 188.
[422] João 1: 12.
[423] Gálatas 2: 20.
[424] II Coríntios 4: 17.
[425] Idem.
[426] Com pequenas variações esse teor é enunciado nos diversos centros livres da linha do Mestre Irineu; “A verdade é que o centro é livre, mas quem assume responsabilidades deve dar conta, pois temos que prestar contas dos nossos trabalhos perante ao Supremo Pai Criador”. Disponível em http://www.mestreirineu.org/decreto.htm
  Acesso em 23 de maio de 2006.

 


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